“...Djalma joga em qualquer posição com a mesma eficiência. Pode não ser um Ademir na velocidade, nem um Augusto no vigor, ou um Lelê na potência do arremate. Mas, cobrindo um vaga, adapta-se ao estilo do time, que não sofre a menor variante”, destacava o uruguaio Ondino Vieira, seu ex-treinador no Vasco da Gama em 1944, que o considerava o “grande jogador do Vasco”.
Esse era o alagoano Djalma Bezerra dos Santos, que nasceu no município de Atalaia no dia 19 de dezembro de 1918.
No começo da adolescência vai residir em Recife. Com apenas 12 anos de idade, ingressa nas categorias de base do Sport Clube Recife. Atacante versátil, defendeu as cores da equipe principal do Leão da Ilha entre 1937 e 1942.
Em Pernambuco se projeta futebolisticamente, daí o motivo de corriqueiramente ter sido chamado de pernambucano, o que não o aborrecia, como destaca matéria do O Jornal (RJ). “Costumava dizer, brincando, que no Nordeste tudo era Pernambuco”.
Djalma fez sua primeira participação no time principal Sport, marcando o gol do empate por 1×1 no clássico contra o Santa Cruz, no Campo da Jaqueira, em partida válida pelo campeonato de 1937.
Djalma é o primeiro agachado, da esquerda para a direita.
No ano seguinte, conquista o seu primeiro titulo oficial, o Campeonato Pernambucano. Ainda em 1938, joga pela primeira vez ao lado do grande Admir Menezes, companheiro com quem atuou em boa parte de sua carreira, em clubes e seleções.
Em 1941, foi novamente campeão pernambucano. No final daquela temporada, foi peça importante do time que excursionou pelo Sul e Sudeste, encantando o Brasil com seu belo futebol. Um histórico Sport, que além de Ademir e Djalma, contava com Manuelzinho, Zago, Magri, Pirombá, entre outros craques. Em Belo Horizonte, a equipe ganhou os três jogos que disputou, façanha que jamais tinha sido alcançada por outro time.
Em 1942, Djalma conquista seu terceiro titulo pernambucano. Seria o último do atacante atalaiense com a camisa do Sport, com a qual balançou as redes 44 vezes pelo time principal.
Durante sua passagem pela Ilha do Retiro, Djalma também defendeu a Seleção Pernambucana, por quem disputou o Campeonato Brasileiro de Seleções Estaduais de 1941 a 1942, com boas atuações e marcando 5 gols.
DO SUCESSO NO SPORT AO APOGEU NO “EXPRESSO DA VITÓRIA”
Jogador versátil e de grande capacidade técnica, o atalaiense daria mais um importante passo em sua carreira no ano de 1943. É que Ademir já estava defendendo a equipe do Vasco da Gama por duas temporadas, quando solicitou à diretoria cruzmaltina que fosse buscar Djalma em Pernambuco. A diretoria atendeu o pedido de seu atacante e o Vasco não se arrependeria.
Chegando ao Rio, não encontrou vida fácil no Vasco e teve que aguardar sua chance. Era naturalmente ponta-esquerda, posição ocupada nesta época por Chico, que vivia uma grande fase.
Djalma não tinha uma posição fixa no cruzmaltino, atuando nas meias, pontas direita e esquerda. Quando era preciso, se adaptava como médio (atual volante) e até como zagueiro. Os jornais da época o apelidaram de “o homem dos sete instrumentos”.
“Fazia um papel tático importante no surgimento do Expresso, pois sabia fechar o meio de campo, dando mais liberdade para as arrancadas de Ademir pelo meio e para os deslocamentos do veloz Isaías pelo setor direito. É um dos nomes mais lembrados daquele período glorioso da história do Vasco”, livro "Um Expresso Chamado Vitória”.
Pelo Vasco conquistou os Torneios Relâmpagos de 1944 e 1946, o tetra municipal em 1944/45/46/47 e os Cariocas invictos de 1945 e 1947, além do Sul-Americano de 1948. Foi titular em grande parte dos jogos de todas essas campanhas.
Era companheiro de equipe do goleiro Barbosa, um dos maiores goleiros de sua época, que foi titular da seleção brasileira na Copa do Mundo de 1950, realizada no Brasil.
Expresso da Vitória é como é conhecido e é considerado pela maioria da torcida o maior esquadrão de futebol da história do Club de Regatas Vasco da Gama e um dos maiores do Brasil, que jogou entre 1942 e 1952. A denominação teria surgido num programa musical da Rádio Nacional, onde um cantor, ao se apresentar, disse que dedicaria a música ao Vasco, chamado por ele de "Expresso da Vitória", por atropelar seus adversários em campo.
CAMPEÃO SULAMERICANO PELO VASCO - PRIMEIRO TÍTULO INTERNACIONAL DE UM CLUBE BRASILEIRO
Em 18 de dezembro de 1947 o Vasco recebeu o convite oficial para a disputa do Torneio dos Campeões Sul-Americanos, em Santiago, organizado pelo clube chileno Colo-Colo. Além do Vasco e do organizador, faziam parte da competição mais cinco clubes: o Nacional, campeão uruguaio de 1947; o Municipal, vice-campeão peruano do mesmo ano; o Litoral, campeão de La Paz em 1947; o equatoriano Emelec, convidado pelo anfitrião; e o River Plate, bicampeão argentino em 1941/42, campeão em 1945 e novamente em 1947. Este era o grande favorito do torneio: exercendo amplo domínio sobre o futebol argentino na década de 40, o time do River, apelidado de La Maquina (A Máquina), tinha como grande estrela Di Stéfano, considerado como o melhor jogador do mundo em sua época, enquanto o elenco argentino era apontado como o grande esquadrão sul-americano. Outro clube apontado como favorito era o Nacional; já o Vasco não gozava de tal prestígio entre a crônica internacional.
Os cruzmaltinos desembarcaram em Santiago no dia 8 de fevereiro de 1948. A delegação vascaína era composta por 26 membros sob a chefia de Diogo Rangel: o diretor, Octávio Póvoas; o médico Amílcar Giffoni; o massagista Mario Américo; o cozinheiro Laudelino de Oliveira; o árbitro Alberto da Gama Malcher; o jornalista Ricardo Serran (do jornal O Globo), o técnico Flavio Costa e dezoito jogadores. O time base era formado por: Barbosa, Barcheta, Augusto, Wilson, Rafagnelli, Ely, Danilo, Jorge, Moacir, Djalma, Nestor, Maneca, Ademir, Dimas, Lelé, Friaça, Ismael e Chico.
A estréia do Expresso ocorreu no dia 14 de fevereiro, contra o Litoral. No primeiro tempo o time vascaíno exerceu forte pressão sobre os peruanos, até Lelé abrir o marcador. No segundo tempo Lelé novamente marcou, abrindo uma vantagem de dois a zero. Logo depois o peruano Sandoval descontou para o Litoral. A partir daí a partida ficou tensa, com muitas jogadas ríspidas. Aos trinta e três minutos, Ismael trocou socos com um adversário e foi expulso. Com menos um, o Vasco passou o resto da partida se defendendo dos constantes ataques peruanos. Há poucos minutos do final o lateral Augusto sai de campo por contusão. Apesar de toda pressão do Litoral, o placar acabou se configurando como uma vitória cruzmaltina por 2 a 1.
O jogo seguinte seria contra um dos favoritos, o Nacional. Nesta partida o Vasco exibiu uma grande atuação, vencendo o time uruguaio por 4x1, gols de Ademir, Maneca, Danilo e Friaça. Assim como no jogo anterior, a arbitragem fora polêmica: o árbitro anulou um gol contra legítimo de um defensor adversário. Ainda na partida, o cruzmaltino Ademir torceu o tornozelo. O exame apontou uma fratura no tornozelo direito, o que tirou o atacante do resto da competição.
Aplicando goleadas em grandes times da época, como o 4 x 1 no Nacional, e 4 x 0 no Municipal, o Vasco foi caminhando ao título invicto. No último jogo, um empate de 0x0 com o River Plate garantiu ao Vasco mais um título, o maior do clube até a conquista da Libertadores da América em 1998.
No dia 24 de abril de 1996, a CONMEBOL reconheceu o Vasco da Gama como o primeiro campeão sul-americano.
Djalma foi titular em todas as partidas desta importante conquista.
Como atleta do Vasco, também foi convocado em inúmeras oportunidades para defender a Seleção Carioca de Futebol. É bicampeão desta competição, em 1944 e 1946.
SELEÇÃO BRASILEIRA
Apesar de suas qualidades excepcionais como jogador, foi chamado poucas vezes para defender a seleção brasileira. Além de alguns amistosos, foi convocado para defender o Brasil no Sulamericano (Copa América) de 1945, disputado em Santiago do Chile.
Fazia parte desta seleção comandada por Flávio Costa, nomes como Domingos da Guia, Jayme de Almeida, Zizinho, Heleno de Freitas, Ademir e Jair da Rosa Pinto.
Djalma atuou em apenas uma partida, foi no jogo contra o Chile, em 28 de fevereiro, quando entrou no segundo tempo, aos 66 minutos, no lugar do Tesourinha. Com gol de Heleno de Freitas, a seleção tupiniquim venceu os donos da casa pelo placar de 1 a 0.
Competição disputada em pontos corridos, a derrota para a Argentina por 3 a 1 em 15 de fevereiro, única do Brasil naquela competição, custou o título para a seleção, terminando na segunda colocação com 10 pontos. Os hermanos foram os campeões, com 11 pontos.
NO BANGU
Abraçado com o craque Zizinho, com quem jogou pela Seleção Brasileira, Seleção Carioca e Bangu.
Em 1949 é considerado negociável pelo Vasco e nos primeiros meses daquele ano é contratado pelo Bangu, que estava montando uma grande equipe e contava com o craque Zizinho, que viria a ser o melhor jogador da Copa do Mundo de 1950. Djalma tinha 30 anos de idade.
Sua estréia pelo Bangu aconteceu em 31 de março de 1949, em um empate por 2 a 2 contra o Flamengo.
Incialmente jogou como atacante, mas depois foi recuando para a meia, chegando a atuar algumas vezes como zagueiro.
Pelo Bangu foram 166 jogos, com 83 vitórias, 30 empates e 53 derrotas. Um aproveitamento de 59%. Balançou as redes em 16 vezes.
Pela equipe de Moça Bonita venceu o Torneio Início do Campeonato Carioca em 1950, derrotando o Vasco na grande final.
Também foi campeão do Torneio Início do Rio-São Paulo de 1951. Foi a única edição do torneio. Foi disputado pelos clubes participantes do Torneio Rio-São Paulo de 1951. Derrotou o Palmeiras por 3 a 0 no primeiro, derrotou o Corinthians por 2 a 0 nas semifinais e na final, após empate por 1 a 1 contra o América-RJ no tempo normal, venceu nos pênaltis por 4 a 1, no Maracanã.
Djalma foi vice-campeão do Carioca de 1951.
No início do ano de 1954, o Bangu fez as três últimas partidas do Campeonato Carioca de 1953. Djalma não jogou as duas primeiras (Flamengo 2 x 0 Bangu e Bangu 3 x 1 Fluminense, no Maracanã), somente tendo atuado na última (Bangu 2 x 1 América, em 16/01/1954, no Maracanã), que acabou sendo, prematuramente, a sua última partida com a camisa alvirrubra.
Terminado o Campeonato Carioca, o Bangu fez um amistoso no domingo seguinte, 24 de Janeiro, contra o Goytacaz e venceu por 4 x 1, no Estádio Godofredo Cruz (Campos dos Goytacazes - RJ), antes de entrar no período de recesso. Findo esse período, o Alvirrubro embarcaria para a Europa onde cumpriria uma jornada vitoriosa de 17 jogos.
“Mas o destino sempre é surpreendente e por vezes surpreende de forma muito dolorosa, como foi no caso de Djalma. Entre o recesso e a excursão à Europa, haveria o Carnaval”, destaca a publicação do Blog Bangu AC 1904.
MORTE TRÁGICA QUE ABALOU O FUTEBOL BRASILEIRO
No dia 1º de março de 1954, uma segunda feira de carnaval, dia em que a Cidade do Rio de Janeiro completava 389 anos, o craque banguense se divertia em um baile carnavalesco vespertino na Associação dos Empregados do Comércio (Centro da Cidade), acompanhado de sua irmã, de nome Dulce, e de uma amiga, de nome Ivone. No meio daquele vai-e-vem no meio do salão, sua irmã teve o seu pé pisado e reclamou com o indivíduo que a teria pisado de forma proposital (teria, não se pode ter certeza de nada); houve uma grande confusão com discussões e ofensas, que de transformou em uma briga de grandes proporções, na qual Djalma encarou cerca de 20 marmanjos, da turma do "pisante". O meiocampista banguense, na luta desigual, sofreu um preocupante ferimento no lado direito do frontal (possivelmente no supercílio), que ocasionou grande sangramento; foi medicado no Hospital de Pronto Socorro (HPS), hoje Hospital Municipal Souza Aguiar, onde sofreu uma sutura de três pontos no local do ferimento.
Depois de medicado, Djalma retornou ao Centro da Cidade para continuar a folia no carnaval de rua. Por volta das 22 horas, sua irmã solicitou que ele a acompanhasse ao seu apartamento, onde ela iria colocar uma outra fantasia para participar de um baile noturno. Ao chegarem ao endereço verificaram que a fechadura estava defeituosa e dando atenção ao sugerido pela vizinha do andar de cima (3º andar), o craque pretendeu descer ao apartamento da irmã, no 2º andar, no segundo andar, segurando uma frágil corda de persiana; a corda partiu-se e caiu na marquise logo abaixo, mas de pé. Mas, para a tristeza da família Bezerra dos santos e da grande família banguense, o jogador desequilibrou-se e se precipitou em queda livre, caindo na calçada, onde sua cabeça chocou-se com violência contra o meio fio. Desacordado, foi novamente conduzido ao HPS, onde lutou contra a morte por quase quinze horas; mas perdeu a batalha e morreu por volta das 13:30 horas daquela terça feira gorda, dia 2 de março de 1954.
A morte trágica de Djalma provocou grande consternação no meio futebolístico carioca e pernambucano, em especial entre os torcedores banguenses, vascaínos e rubro-negros do Recife.
Em excursão pelo México, o Vasco da Gama lhe presta homenagens póstumas. Oficio é enviado. Os vascaínos atuaram contra a equipe do Oro com braçadeiras pretas. Também realizaram uma missa de sufrágio em um dos templos mais tradicionais do México.
Era casado com Dona Teresinha Paes dos Santos, com que tinha dois filhos.
Em homenagem póstuma, a Confederação Brasileira de Desportos (CBD) lhe concede o prêmio Belford Duarte, entregue em cerimônia a sua esposa.
*Ajudaram na elaboração desta matéria informações obtidas na Revista Esporte Ilustrado (RJ), O Jornal (RJ), A Noite (RJ), Jornal de Noticias (RJ), Diário da Noite (RJ), O Globo Esportivo (RJ), Blog Os Gigantes da Colina, Blog Bangu AC 1904, Site Imortais do Futebol, Site oficial do Bangu e Revista Lance.